Permito-me

Mesmo não querendo, eu me permiti esquecer você. Me permiti não esperar mais nada de você, além de um sorriso de longe, uma companhia na volta pra casa um dia ou outro. Eu não queria. Eu juro que se você tivesse  me pedido, eu ainda estaria se esperando e acreditando que no fim tudo ia dar certo. Mas não, não deu. E eu saí machucada, triste, mas sabendo que eu fiz tudo o que podia pra dar certo. Pena que você não queria que desse certo.
Mas, tudo bem moço, eu gostei de nós por nós dois. E foi lindo enquanto eu pude aproveitar.
Espero que você não me esqueça, mesmo que eu seja só uma pequena lembrança pra você, não me apague totalmente. Lembre que um dia você foi ao menos feliz comigo, que eu te fiz bem por uns dias, que eu vesti aquela sua camiseta velha da sua banda preferida enquanto arrumava sua janela e que eu tinha um cheiro bom.
Porque eu não vou esquecer de você, só vou te guardar.

Ouvir com os olhos.

"De tanto não poder dizer,
Meus olhos deram de falar.
Só falta você ouvir."




(Alice Ruiz)



Só enquanto eu respirar...


Esse é meu vô. Ele faleceu nessa sexta-feira, dia 13, mas isso não faz diferença. Essa é um das pouquíssimas fotos que tenho dele e com ele. Essa foi no último natal. 
Ele nunca foi um homem de muitas palavras e muitos sorrisos e quando eu era pequena eu tinha medo dele, sempre tão bravo e sério. Mas, eu cresci e aos poucos perdi o medo e restou só o amor, e o respeito. 
Eu lembro bem que, até os meus 7 anos de idade meu avô era alcoólatra, estava sempre bêbado e acho que era dai que vinha meu medo. Mas, certa vez, eu me sentei na calçada e fiquei olhando a rua, como sempre gostei de fazer e ele chegou com uma garrafa escondida. Ele a pegou e guardou entre uns arbustos que havia dentro da casa. Quando ele saiu, eu não sei o por quê, ou o que me fez fazer aquilo, mas eu simplesmente fui até o arbusto e peguei a garrafa. Eu a abri e joguei tudo que tinha dentro no chão. E depois senti medo. Muito medo. E fiquei esperando até ele sentir falta, o que não demorou muito. Quando eu o ouvi gritar eu corri pro banheiro, me escondi e chorei. Ele queria me bater. 
Minha mãe veio até a porta e pediu pra eu abrir. Com muito custo e depois de um pouco mais calma eu sai. Meu vô já não estava mais em casa. Tinha ido beber na rua, de raiva. E quando ele voltou, mais bêbado que antes, ele chorava. 
Eu nunca vou esquecer aqueles olhos azuis olhando pra mim, vermelhos e cheio de água.
Ele chorou, ele me abraçou e disse que eu era um anjo. 
Ele me abraçou e chamou todos os netos pra perto dele, e ali, bêbado como estava, ele nos disse "O vovô nunca mais vai beber.", e eu ri, eu e um dos meus primos, rimos e pensamos que ele falava aquilo da boca pra fora, afinal, ele era só um bêbado. 
Meu vô bebia muito e fumava também. E depois disso, ele nunca mais colocou uma gota de álcool na boca. Ele nunca mais acendeu um cigarro. E o meu medo por ele foi passando. 

Ele continuou sendo como era, homem de poucas palavras, meio rude, quieto. Mas, agora era diferente. 
E foi assim até o dia da sua morte. 

Eu me sinto feliz, por saber que eu fiz algo por ele. 
Eu só queria ter dito a ele que eu o amava.  E ainda amo. Mas eu fiquei calada e agora não dá mais pra dizer. 


Vou sentir saudade dos seus olhos azuis. 

O que você nunca vai saber.







"Não pretendo te contar sobre minhas lutas mentais. Você terá nas mãos minha simplicidade e minha leveza, que podem não ser totalmente verdadeiras, mas foram criadas com muito carinho pra não assustar pessoas como você. Não vou ficar falando sobre a complexidade dos meus pensamentos, minha dualidade ou minhas dúvidas sobre qualquer sentimento do mundo. Vou te deixar com a melhor parte, porque eu sei que você merece. Guardo pra mim as crises de identidade e a vontade de sumir. Não vou dissertar sobre minhas fragilidades e minhas inseguranças. Talvez eu te diga algumas vezes sobre minha tristeza, mas só pra ganhar um pouquinho mais de carinho. Ofereço meu bom humor e minha paciência e você deve saber que esta não é uma oferta muito comum.


(...) Vou te pedir que fique. Mesmo que o futuro seja de incertezas, mesmo que não haja nada duradouro prescrito pra gente. Esse é um pedido egoísta, porque na verdade eu sei que se nada der realmente certo, vou ficar sem chão. Mas por outro lado, posso te fazer feliz também. É um risco. Eu pulo, se você me der a mão.


Você não precisa saber que eu choro porque me sinto pequena num mundo gigante. Nem que eu faço coisas estúpidas quando estou carente. Você nunca vai saber da minha mania de me expor em palavras, que eu escrevo o tempo todo, em qualquer lugar. Muito menos que eu estou escrevendo sobre você neste exato momento. E não pense que é falta de consideração eu dividir tanto de mim com tanta gente e excluir você dessa minha segunda vida, porque há duas maneiras de saber o que eu não digo sobre mim: lendo nas entrelinhas dos meus textos e olhando nos meus olhos. E a segunda opção ninguém mais tem."


(Verônica Heiss)




Photo: cena de Brilho Eterno de Uma Mente Sem Lembranças.

Lembrar e não esquecer.

Tenho um milhão de coisas pra escrever aqui. Alguns choros engolidos. Algumas coisas que escrevi em uns papéis. Algumas histórias boas que não quero esquecer. Li uma vez uma frase do Carpinejar que dizia "Quem não tem memória faz uma de papel." ou algo assim... Por isso escrevo. Não pra lembrar, mas, pra não esquecer. Não quero esquecer nada que tenha sido bom. Quero ter sempre guardadinho na memória todas as manhãs, todos os sorrisos, todas as suas pintinhas charmosas e o seu cheiro bom. Não esquecer de nada disso e lembrar que a gente pode ser feliz. É, lembrar. Pra que a gente não se esqueça.